Entenda a importância da evapotranspiração das culturas, quais os seus tipos e que fatores influenciam neste processo.
A água é um recurso fundamental para a manutenção da vida e, para as culturas agrícolas isso não é diferente, uma vez que o déficit hídrico, principalmente, pode impactar diretamente na produtividade das lavouras.
Desta forma, é fundamental conhecer a evapotranspiração das culturas, ou seja, a perda de água para a atmosfera via evaporação da água do solo e transpiração das plantas.
Além disso, é possível utilizar a evapotranspiração no dimensionamento de sistemas de irrigação e até mesmo no planejamento de uma cultura.
Entenda, a seguir, o que é a evapotranspiração, qual a sua aplicação na agricultura, quais fatores estão relacionados a ela e muito mais!
O que é a evapotranspiração
Antes de entender o que é a evapotranspiração, é necessário conhecer os processos que fazem parte dela: a evaporação e a transpiração.
Evaporação (E)
Em resumo, a evaporação é um processo físico, no qual ocorre a mudança de fase água, do estado líquido para o gasoso.
Esta evaporação da água na atmosfera é proveniente de lagos, rios, oceanos e da vegetação (por meio da evaporação do orvalho depositado sobre as folhas e da água absorvida pela vegetação através das chuvas).
Para que o fenômeno ocorra é necessário energia, ou seja, calor latente de vaporização.
Transpiração (T)
A evaporação de água da vegetação é chamada de transpiração. Neste processo, a água das chuvas que incidiu e ficou armazenada nos solos, passou pelas plantas e fez parte do seu metabolismo, é transferida para a atmosfera.
Além disso, a transferência ou passagem da água da planta para a atmosfera ocorre através dos estômatos, nesta ordem: do solo para os vasos condutores da planta, depois mesófilo, estômatos e, por fim, para a atmosfera.
Nesta transferência, a água passa por uma série de resistências relacionadas ao solo e aos tecidos da planta.
É importante ressaltar que, é impossível realizar a distinção da água evaporada do solo e transpiração das plantas. Dessa forma, para o cálculo da evapotranspiração se analisa a água no solo e da vegetação úmida, através da transpiração.
Evapotranspiração
Por fim, a evapotranspiração é a ocorrência simultânea da transferência da água para a atmosfera através dos processos de evaporação e transpiração.
Tipos de evapotranspiração
1. Evapotranspiração Potencial (ETP) ou Evapotranspiração de referência (ETo)
É a evapotranspiração de uma área vegetal em pleno crescimento, recobrindo todo o solo e com altura entre 8 e 15 cm, sem que haja restrição hídrica.
Nesta situação, a evapotranspiração depende exclusivamente das variáveis meteorológicas, ou seja, saldo da radiação, temperatura, umidade relativa e velocidade do vento, sem considerar os fatores relacionados a cultura, solo e manejo.
Em resumo, a ETP ou ETo é a lâmina de água que a cultura utilizaria sem restrição de água.
2. Evapotranspiração real da cultura (ETr)
A evapotranspiração real é a quantidade real, ou seja, efetiva que uma superfície com presença de vegetação irá utilizar com ou sem restrição hídrica (déficit de precipitações).
3. Evapotranspiração de cultura (ETc)
A ETc é a evapotranspiração de uma cultura em determinada fase ou estádio de desenvolvimento, com ou sem restrição hídrica e em condições adequadas ou ótimas de crescimento.
Além disso, a ETc depende de condições meteorológicas, tipo de cultura e suas características de resistência ou tolerância à seca e da área foliar (relacionado ainda com a densidade e espaçamento da cultura a campo).
4. Evapotranspiração de Oásis (ETO)
A ETO é a evapotranspiração de uma área com presença de vegetação e umidade disponível do solo, oriunda de irrigação.
Em torno da área úmida, existe uma área seca que não recebe irrigação e, dessa forma, fornece energia para a evapotranspiração da cultura devido a passagem de parte da água para a área seca.
Os fatores influenciam na evapotranspiração
Os fatores determinantes para o processo de evapotranspiração estão relacionados, principalmente, ao clima, planta e manejo de solo.
Fatores climáticos
- Incidência solar sobre a cultura e temperatura do solo: devido a grande energia da radiação solar, grande quantidade de água líquida pode ser rapidamente transformadas em vapor d’água, evaporando para a atmosfera;
- Temperaturas do ar durante os diferentes estádios de desenvolvimento da cultura: em dias nublados a perda de água pela evapotranspiração é menor do que em dias ensolarados e quentes;
- Umidade do ar: a diferença entre a pressão de vapor de água na superfície dos tecidos das plantas e do ar é fator determinante na remoção do vapor de água para atmosfera;
- Velocidade do vento: a remoção da água depende do vento e da turbulência do ar.
Fatores relacionados às plantas
- Estádio de desenvolvimento;
- Altura das plantas;
- Área foliar: a transpiração ocorre, principalmente, pelas folhas, via estômatos. Desta forma, quanto maior a área foliar, maior a transpiração;
- Profundidade de raízes;
- Espécie.
Fatores relacionados ao manejo de solo
- Características relacionadas a textura e estrutura do solo, principalmente a porosidade;
- Disponibilidade hídrica e capacidade de armazenamento de água do solo;
- Cobertura do solo e sistema de manejo (em plantio direto, por exemplo, a água é retida pela camada de palhada que mantém a temperatura do solo mais baixa que no ambiente externo reduzindo a velocidade da evaporação da água do solo para a atmosfera);
- Espaçamento, densidades de plantio e orientações de plantio;
- Impedimentos físicos e químicos como curvas de níveis, terraços, bacias de contenção;
- Uso de quebra-ventos.
Aplicação dos cálculos da evapotranspiração para a agricultura
O conhecimento sobre a evapotranspiração das culturas em diferentes regiões e relacionada às características do solo, manejo e até mesmo do material genético (cultivar) são fundamentais para o planejamento na lavoura.
- Em dimensionamentos de sistemas de irrigação, por exemplo, é indispensável calcular a evapotranspiração da cultura (ETc) para a estimativa da lâmina de água a aplicar, evitando desperdícios,
- Pode-se ainda, a partir do conhecimento desta variável, planejar os materiais que serão implantados em função da característica da região de cultivo e até mesmo da área. E, assim optando, por exemplo, por aqueles mais resistentes à seca ou tolerantes em locais da área com características que não permitam o acúmulo de água no solo (solos rasos, por exemplo).
- Além disso, conhecendo a evapotranspiração da cultura, pode-se ainda planejar a época mais crítica, com maior necessidade de água e maior evapotranspiração, para que esta não coincida com épocas que ocorram restrições hídricas que possam comprometer o desempenho e a produtividade final da cultura.
Como estimar a evapotranspiração das culturas
A evapotranspiração estimada das culturas pode ser calculada a partir de diferentes métodos empíricos, físicos ou a combinação de ambos.
Além disso, os dados utilizados nos cálculos podem vir de equipamentos simples como estações meteorológicas e até mesmo sensores sofisticados e com uso da inteligência artificial.
Desta forma, as metodologias utilizadas apresentam nível de precisão diferentes e são empregadas de acordo com os dados e recursos disponíveis.
Métodos científicos
Para fins de estudo científico, existe o método de medida da evapotranspiração potencial (ETP ou ETo).
Neste caso, por exemplo, é possível usar o tanque classe A, e obter a lâmina de água evaporada em uma determinada área.
Além disso, há outros métodos científicos como o lisímetro de drenagem, de pesagem, e de lençol freático constante, em que se utilizam tanques com culturas agrícolas implantadas.
Métodos de estimativa
Existem diversos modelos disponíveis como, por exemplo, os métodos:
- Thornthwaite,
- Thornthwaite – Camargo (alterado por Camargo)
- Camargo
- Hargreaves & Samani
- Priestley-Taylor
- Penman-Monteith FAO.
Este último é o método mais recomendado para cálculo de estimativa da evapotranspiração da cultura de referência.
Pode-se realizar o seu cálculo pela fórmula a seguir:
Penman- Monteith
Critérios para escolha do melhor modelo
É importante levar em consideração três fatores principais para escolher o método que melhor se adequa e, assim, realizar os cálculos de estimativa da evapotranspiração:
- Os dados meteorológicos disponíveis
- A escala de estimativas: quando se objetivam cálculos de estimativa diária de evapotranspiração, os modelos de tanque de Classe A são mais adequados. O método Thornthwaite, por exemplo, só é utilizado em estimativas mensais.
- Aplicação x condições climáticas locais: os métodos de Penman-Monteith, Priestley-Taylor e tanque Classe A, por exemplo, independem de clima seco ou úmido, sendo aplicados de forma universal (para diferentes condições de clima).
O método Penman-Monteith-FAO (PM- FAO) tem apresentado bastante precisão em estudos no Brasil e no mundo. Por isso, é recomendado como padrão quando os dados necessários ao seu cálculo estão prontamente disponíveis, independentemente da escala temporal e espacial.
Desta forma, a análise das condições do local, bem como objetivo das mesmas e dados meteorológicos disponíveis deverão orientar na escolha do modelo mais adequado.
Conclusão
Em resumo, devido à importância da água na agricultura e a sua distribuição irregular em diversos períodos durante o cultivo, o conhecimento e o monitoramento da evapotranspiração são fundamentais. A partir disso, é possível gerenciar a demanda hídrica das culturas, por meio da irrigação e do planejamento do plantio.
Além disso, diversos fatores climáticos, do solo e do próprio manejo das culturas podem influenciar na evapotranspiração, por isso é importante compreender cada um deles.
A água é um recurso primordial para a manutenção da vida e, por isso, o seu manejo, seja na agricultura ou outros fins, merece bastante atenção.
Engenheira Agrônoma (UFFS), Mestra em Fitossanidade pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), com área de concentração fitopatologia. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) na área de sanidade vegetal e pós-colheita. Tem experiência nas áreas de fitopatologia, controle de doenças de plantas, grandes culturas, pós-colheita de grãos e sementes e agricultura de precisão.