Manejo

Micotoxinas no Milho: tudo o que você precisa saber

Entenda como são produzidas as micotoxinas no milho e saiba quais são as boas práticas para evitar a contaminação dos alimentos do campo à pós-colheita

O milho é um grão indispensável na dieta humana e em diversos produtos industrializados e consumidos diariamente, além de estar presente na dieta animal, principalmente em rações.

Atualmente, o Brasil é o quarto maior produtor mundial de grãos, ocupando a terceira posição para a cultura do milho.

Além disso, o País também é destaque na produção de carne bovina,  possuindo o maior rebanho do mundo, e isso demanda grande quantidades de milho, tanto em grãos, como em rações e em forma de silagem.

Assim, um dos grandes objetivos da produção de milho é manter a qualidade do produto final. Porém, diversos fatores podem interferir neste processo. A presença micotoxinas, por exemplo, é um grande desafio.

Essas micotoxinas são produzidas por fungos e podem causar sérios problemas à saúde animal e humana. Isso porque, elas são termoestáveis, ou seja, não são inativadas pelo processamento em altas temperaturas. Além disso, elas também se acumulam no organismo.

Então, confira a seguir o que são micotoxinas, como elas se formam nos grãos e como você pode reduzir a contaminação da silagem e dos grãos armazenados na sua fazenda!

Cenário mundial

De acordo com estudos, entre 25% a 50% de todas as commodities do setor primário produzidas no mundo estão contaminadas com micotoxinas.

Além disso, há diferenças significativas nos níveis de contaminação quando comparados os dados de países desenvolvidos (como Estados Unidos), em desenvolvimento (como o Brasil), e subdesenvolvidos (países do continente africando, por exemplo). 

Isto porque, países desenvolvidos possuem maiores recursos e tecnologias envolvidas na produção e armazenamento além de maior poder de compra de produtos de qualidade.

Desta forma, no Brasil, por exemplo, os produtos restantes (muitas vezes desclassificados do padrão de qualidade exigido), tem por destino o consumo no mercado interno ou a exportação para países subdesenvolvidos.

Outro ponto importante é que diversos países, principalmente do continente europeu, possuem legislações cada vez mais rígidas sobre limites máximos da presença destes contaminantes nos grãos, ligando um alerta para possíveis restrições futuras.

Assim, cada vez mais produtores e profissionais envolvidos na produção de alimentos terão de estar atentos ao controle de qualidade, bem como às boas práticas agronômicas para reduzir ao máximo a contaminação por fungos produtores de substâncias tóxicas.

O que são as micotoxinas?

As micotoxinas ou substâncias toxicogênicas são substâncias produzidas por fungos que não são utilizados por eles e não têm qualquer função no seu metabolismo.

A produção destas micotoxinas acontece depois de alguns fungos alcançarem a maturidade em contato com a cultura ainda em campo ou, posteriormente, durante o armazenamento. E isso, principalmente quando o armazenamento é feito em condições de alta umidade e temperatura.

Vale ressaltar que, ao olhar para o grão, o fato de não ver a presença de fungos não garante que essas toxinas não estejam presentes no material.

Isto porque, os fungos podem ter produzido as toxinas e não estarem mais associados aos grãos. Ou seja, uma vez produzidas, as toxinas permanecem nos grãos, independentemente da presença do fungo.

Como as micotoxinas se formam nos grãos de milho?

É possível classificar os fungos que produzem micotoxinas em dois grupos: 

  • Aqueles que infectam as plantas ainda em campo, sendo chamados de fungos de campo;
  • Aqueles que infectam os grãos durante o armazenamento, chamamos então de fungos de armazenamento.

A diferença entre estes dois grupos é a necessidade de condições ambientais específicas para a sua sobrevivência. Por isto, durante o armazenamento boa parte dos fungos de campo diminuem a sua presença nos grãos.

Já os fungos de armazenamento necessitam de menor umidade para a sua sobrevivência, infecção, colonização e reprodução nos grãos. Por isso, a sus presença tende a aumentar durante o armazenamento.

Outro fator relevante é que os fungos de armazenamento estão presentes em todos os ambientes, principalmente aqueles com baixo grau de limpeza.

Além disso, um fator que contribui para o desenvolvimento destes microrganismos é a colheita dos grãos com teor de água (umidade) acima do recomendado e posterior armazenamento em condições de temperatura inadequadas, principalmente altas, e em locais sem ventilação.

Esquema da produção de micotoxinas em grãos (Fonte: Impextraco, 2021)

A produção das micotoxinas ocorre da seguinte forma: 

  1. Primeiro, o patógeno (fungo) sobrevive ou nos restos culturais do cultivo anterior (e até mesmo no solo, sementes contaminadas ou em plantas hospedeiras alternativas, como daninhas).
  2. Depois, infecta a planta, principalmente na fase de enchimento de grãos.
  3. Os fungos se reproduzem nas espigas e, quando atingem a maturidade, produzem as toxinas.
  4. Se os grãos vêm do campo com boa qualidade, podem ser infectados pela presença destes fungos nas unidades de beneficiamento. Por isto, é importante que o teor de água dos grãos, bem como a umidade e a temperatura do local de armazenamento sejam monitoradas.

Veja os principais fungos que produzem micotoxinas no milho

Diversos fungos podem infectar a cultura do milho durante todo o seu ciclo. No entanto, aqueles capazes de produzir micotoxinas são os mais preocupantes.

Isto porque, eles causam danos ao grão e interferem na sua classificação. Além disso, podem afetar a saúde animal e humana quando consumidos.

Danos como grãos ardidos e mofados reduzem a qualidade e valor nutricional dos grãos, além da qualidade dos produtos produzidos a partir destes.

Então, veja a seguir os limites máximos de tolerância expressos em percentual (%) de acordo com Instrução Normativa 60/2011.

  • Grãos Tipo 1
    • Grãos avariados ardidos: 1%
    • Avariados total: 6%
    • Quebrados: 3%
    • Matérias estranhas e Impurezas: 1%
    • Carunchados: 2%
  • Grãos Tipo 2
    • Avariados ardidos: 2%
    • Grãos avariados total: 10%
    • Quebrados: 4%
    • Matérias estranhas e Impurezas: 1,5%
    • Carunchados: 3%
  • Grãos Tipo 3
    • Avariados ardidos: 3%
    • Avariados total: 15%
    • Grãos quebrados: 5%
    • Matérias estranhas e Impurezas: 2%
    • Carunchados: 4%
  • Grãos fora de tipo
    • Avariados ardidos: 5%
    • Avariados total: 20%
    • Grãos quebrados: maior do que 5%
    • Matérias estranhas e Impurezas: maior do que 2%
    • Carunchados: 8%
Grãos mofados e ardidos de milho (Fonte: Aiba, 2015)

Fungos que produzem micotoxinas

Os principais fungos que causam danos em grãos de milho são os pertencentes aos gêneros Fusarium, Aspergillus e Penicillium.

Grãos de milho infectados com diferentes espécies de fungos causadores de danos do tipo grãos ardidos e mofados (Fonte: Silva et al., (2015)
Espiga de milho e grãos, apresentando podridão por fungos produtores de micotoxinas (Fonte: Silva et al., 2015)

Fusarium

Fungo produtor de diversas micotoxinas, sendo as fumonisinas as principais.

Dentre os mais de 16 tipos de fumonisinas descritos, destaca-se a FB1, produzida em maiores quantidades, principalmente pelo patógeno Fusarium verticillioides, causador da podridão das raízes (correspondente a 70% do total de todas as fumonisinas encontradas em alimentos).

Outras espécies de Fusarium produzem ainda: 

  • Zearalenona: F. graminearum, F. culmorum, F. equiseti e F. cerealis. Todas as espécies de Fusarium citadas infectam cereais, incluindo tomate e banana.

Vale destacar que, temperaturas amenas e condição de alta umidade favorecem esse fungo a produção das micotoxinas em todos os estádios de desenvolvimento da cultura. 

  • Desoxinivalenol (DON): conhecida ainda por vomitotoxina ou fator de recusa de alimentos. Isto porque, quando consumida em pequenas quantidades, principalmente por porcos, provoca perda de peso e recusa alimentar. Além disso, as espécies de Fusarium que produzem esta micotoxina são: F. graminearumF. culmorum.

Aspergillus

Patógenos deste gênero são conhecidos pela produção das aflatoxinas, incluindo as B1, B2, G1 e G2. 

Além disso, as espécies de aspergillus associadas a produção destas micotoxinas são principalmente: A. flavus, A. parasiticus, A. nomius, A. bombycis, A. psudotamarii, e A. ochraceoroseus.

Aspergillus flavus é a espécie mais encontrada em milho, principalmente pela sua capacidade de resistir e crescer em uma ampla faixa de condições de umidade e temperatura. Além de estar presente na maioria dos ambientes.

E quais são os riscos para a alimentação animal?

As micotoxinas são inevitáveis na cadeia alimentar humana. Isso porque, a contaminação pode ocorrer tanto de forma direta, pela ingestão do grão in natura; como de forma indireta, quando nos alimentamos daquilo que foi produzido a partir do grão de milho, como por exemplo: carnes, ovos, leite, farinhas, dentre outros derivados.

Isso porque, elas não são eliminadas na industrialização e nem pelo metabolismo humano ou animal. Entretanto, é possível reduzir bastante a sua concentração através do beneficiamento.

Além disso, essas micotoxinas se acumulam gradativamente no organismo animal ou humano, podendo causar danos imediatos à saúde ou a longo prazo.

Então, confira a seguir:

  • As principais micotoxinas;
  • O fungo que a produz;
  • Quais danos pode provocar em animais e humanos;
  • E em quais alimentos são mais comuns, além do milho.
Limites máximos tolerados de micotoxinas em milho e derivados no Brasil (Fonte: PRESTES et al., 2019)

Dependendo do tipo de micotoxina, os limites máximos podem ter variação. Além disso, como é possível observar nas tabelas acima e abaixo, os limites máximos tolerados podem variar em diferentes países.

Limites máximos tolerados de micotoxinas em milho e derivados produzidos e comercializados nos Estados Unidos da América (Fonte: PRESTES et al., 2019)
Limites máximos tolerados de micotoxinas em milho e derivados produzidos e comercializados na União Europeia (Fonte: PRESTES et al., 2019)

Boas práticas para evitar a formação de micotoxinas em grãos de milho armazenados

É possível eliminar os fungos através de um tratamento fitossanitário ou, então, nas fases de beneficiamento. Além disso, a eliminação também acontece se as condições ambientais forem desfavoráveis para sua sobrevivência.

  • Campo: atenção para o controle de doenças, em todos os estádios de desenvolvimento da cultura, principalmente na fase de grão farináceo (devido à acumulação do amido, acima da linha é duro e abaixo é macio).
Representação dos diferentes estádios de grãos de milho em espiga. O grão farináceo corresponde ao estádio R5 (Fonte: Erick Henrique, 2016)
Grãos de milho totalmente farináceos (Fonte: Aiba, 2015)
  • Colheita: em caso de não haver um local para secagem, é preciso realizar a colheita quando os grãos estiverem com 14% de umidade (teor de água). Além disso, para evitar perdas no campo, havendo disponibilidade de locais para secagem, é possível realizar a colheita com no máximo 23% de umidade, sendo o valor ótimo de 18% a 22%.
  • Pré-limpeza e limpeza: eliminação de grãos quebrados e deteriorados que possam estar contaminados, principalmente em peneiras, desta forma é possível reduzir a concentração de micotoxinas.
  • Secagem em secador ou ventilação forçada: é necessário, dependendo do teor de água que os grãos foram colhidos, para a manutenção de baixos teores de água durante o armazenamento. Além disso, a temperatura máxima do ar de secagem deve ser de 60ºC para grãos de consumo e 40ºC para semente;
  • Armazenados em condições ideais: deve ser feito com teor de água adequado (após a secagem deve ser de 11% para armazenamento de até 1 ano e 9-10% para armazenamento de até 5 anos), em temperatura e local seco, podendo ser em silos a granel ou bags.

Por fim, deve ser realizado o monitoramento constante da temperatura da massa de grãos e teor de água, assim como controle de pragas e doenças.

Conclusão

Em resumo, a presença de micotoxinas em grãos de milho é danosa tanto a saúde animal quanto à saúde humana.

Por isso, o controle dos patógenos produtores de micotoxinas deve ser realizado em todas as etapas de produção da cultura, ou seja, do campo à pós-colheita.

Além disso, as legislações, tanto nacionais, quanto internacionais, tendem a ser cada vez mais rígidas quanto aos limites máximos permitidos destes contaminantes. Assim, produtores e profissionais do agro devem ter cada vez mais um papel fundamental na redução da presença de micotoxinas em grãos de milho.

Leia também: “Colheita do milho: veja quais são os cuidados para a melhor conservação dos grãos

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