Colheita do café no Brasil: conheça alguns cuidados essenciais para manter a qualidade dos frutos e, assim, ter maiores chances de uma bebida final de excelência
O café é cultivado em diferentes regiões do mundo, sendo a América Latina responsável por 46% da produção mundial deste grão.
Desse total, o Brasil é responsável por 76% da produção! Por isso, falar da colheita de café por aqui é fundamental.
De acordo com a Conab, na safra de 2022, a estimativa é de uma colheita de 53,43 milhões de sacas beneficiadas, valor abaixo das expectativas iniciais para um ano de bienalidade positiva – devido à condições climáticas adversas nas lavouras.
E falando nas lavouras, várias condições têm impacto nos resultados produtivos e na qualidade do café, como é o caso da temperatura e altitude. Outro exemplo é o ponto de colheita, que se reflete na qualidade final da bebida.
Assim, é necessário conhecer cada uma delas!
Então, entenda a seguir a importância de uma boa colheita, quando realizá-la e muito mais!
A produção de café no Brasil
Devido às condições climáticas favoráveis em diferentes regiões do Brasil, o café se adaptou aos solos brasileiros e passou a ser cultivado em diversos estados.
Atualmente, o café é cultivado nas regiões:
- Norte: estados de Roraima e Amazonas;
- Nordeste: Bahia;
- Centro-Oeste: Mato Grosso e Goiás;
- Sudeste:
- Minas Gerais – regiões Sul e Centro-Oeste, Triângulo, Alto Paranaíba e Noroeste; Zona da Mata, Rio Doce e Central; Norte e Jequitinhonha e Mucuri;
- Estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, e São Paulo;
- Sul: Paraná.
As regiões Centro-Sul são as principais produtoras, e o estado de Minas Gerais é responsável por 46% da produção nacional de café, sendo o maior estado produtor.
Na safra de 2022, por exemplo, a expectativa de produção da região Centro-Sul é de 46,98 milhões de sacas, e a região Norte/Nordeste, 6,36 milhões de sacas.
Os resultados de produção são superiores a safra de 2021, mesmo com condições climáticas desfavoráveis (frio e geadas) que ocorreram nas regiões produtoras, devido à bienalidade positiva do café.
Café Arábica e o Café Conilon
As espécies mais cultivadas no Brasil são Coffea canephora P., conhecida popularmente como café conilon e Coffea arábica conhecido como café arábica.
Ambas as espécies possuem características próprias, principalmente químicas, que resultam em cafés de diferentes características:
- Café arábica: a bebida produzida é mais aromática, e com acidez mais marcante e perceptível quando consumida, além disso, em comparação ao conilon, é menos encorpada. Em comparação ao conilon, tem um valor comercial mais elevado, devido às suas características e pontos de torra e moagem que podem proporcionar diferentes notas (sabores).
- Café conilon: possui como característica principal um sabor amadeirado que resulta em uma bebida mais amarga, em comparação ao arábica; e é considerado mais encorpado e de baixa acidez. Também é conhecido como robusta e, por apresentar um maior rendimento industrial, é mais utilizado na produção de cafés solúveis, não possuindo variações em seu sabor.
Assim, devido às diferenças entre arábica e conilon, é possível preparar vários cafés com blend (mistura de diversas proporções) entre as duas espécies, o que confere inúmeras possibilidades de sabor para esta bebida tão consumida no país.
Além disso, o café brasileiro é apreciado e reconhecido em todo mundo, como sendo um café de excelente qualidade, com sabores que só são alcançados devido também às condições climáticas e tipos de solo encontrados no país.
Qual é a importância de uma boa colheita do café?
O ponto de colheita é um dos fatores chaves para uma boa qualidade final da bebida e máximo aproveitamento possível, podendo definir a qualidade de todo o processo produtivo.
Por exemplo, uma colheita antes do momento correto pode levar a uma maior quantidade de frutos verdes, o que exigirá um maior tempo de secagem – por conter maior teor de água (ou grau de umidade) nos grãos.
Além de haver menor qualidade do produto final, devido aos grãos não estarem com a composição química ideal.
No entanto, com uma colheita tardia, é possível que ocorra a perda de um grande volume de frutos devido à queda no solo.
Além disso, dentre todo o processo produtivo, a colheita é o de maior custo, especialmente por ser realizada com grande quantidade de mão de obra em diversas regiões produtoras.
Por este motivo, a colheita mecanizada tem aumentado de forma considerável. Porém, ela ainda é limitada em áreas de relevo acentuado, por exemplo.
Quando realizar a colheita do café?
A colheita é realizada quando os frutos atingem a maturação, onde as características físicas e químicas são alcançadas – o que interfere nas características sensoriais, ou seja, de sabor e aroma.
O ideal é que 50% ou mais dos frutos tenham atingido a maturação, ou seja, o fruto cereja.
No entanto, é importante atenção para não colher tardiamente, o que gera perdas por queda de frutos ao solo.
Época de colheita de arábica e conilon nas principais regiões produtoras
Devido às diferenças entre as espécies (além das químicas), o tempo de florada e formação do fruto também são distintos, o que confere épocas diferentes de colheita para as espécies.
Enquanto para o café arábica o tempo de florada e formação do fruto leva em torno de 7 a 9 meses, para a espécie conilon, este tempo é de 10 a 11 meses, por tanto, superior ao arábica.
Veja a seguir os meses de início e final de colheita, de acordo com os dados da CONAB (levantamento de maio de 2022):
- São Paulo: abril a setembro, dependendo da região de cultivo dentro do estado;
- Minas Gerais: tem início em maio e finaliza em setembro;
- Espírito Santo: tem início na segunda quinzena de maio e se encerra em dezembro, dependendo das condições climáticas;
- Bahia: maio a novembro;
- Rondônia: maio a julho;
- Paraná: maio a setembro;
- Rio de Janeiro: maio a setembro;
- Goiás: maio a setembro;
- Mato Grosso: maio a agosto;
Métodos de colheita do café
Existem diferentes formas de realizar a colheita do café, relacionados ao nível tecnológico disponível na propriedade, bem como com o objetivo da produção e recursos financeiros disponíveis.
Em relação ao fruto, ela pode ser plena ou seletiva.
Colheita plena
Na colheita plana o produtor realiza a colheita de todos os frutos presentes na planta.
Este é o método mais utilizado, pois otimiza o processo. Além disso, no beneficiamento, através do uso de máquinas de classificação, os frutos verdes e bóia são retirados, melhorando a qualidade do lote.
A colheita plena só deve ser realizada quando o maior número de frutos estiverem com aspecto cereja, ou seja, vermelho, o que indica maturação.
O percentual de frutos verdes não deve ser superior a 30%, por isso, é importante realizar a colheita no momento ideal.
Colheita seletiva
Na colheita seletiva são colhidos apenas aqueles frutos que estão com características visuais de maturação – alteração da cor verde para vermelha, chamados de “cereja”.
A colheita seletiva é feita, principalmente, de forma manual. No entanto, já existem, máquinas que têm a capacidade de colher de forma seletiva, ou seja, somente os frutos cereja.
Neste sistema, a colheita pode iniciar logo que se verifique um bom percentual de frutos maduros, pois a colheita dos frutos verdes restantes será feita quando estes atingirem a maturação.
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Colheita manual, semi-mecanizada e mecanizada
Já em relação à mão de obra, recursos financeiros e objetivo da produção, a colheita pode ser: manual, semi-mecanizada ou mecanizada. Veja abaixo:
- Manual: utiliza mão de obra na colheita. Neste tipo, é possível selecionar os frutos que serão colhidos em função do seu ponto de maturação (o que exige treinamento das pessoas que realizam a colheita);
- Semi-mecanizada: nesta colheita é usada um conjunto de mão de obra mais maquinário;
- Mecanizada: as plantas são colhidas apenas com o uso de máquinas, e é possível até realizar a colheita e poda de forma conjunta, otimizando os processos.
Amostragem para tomada de decisão sobre a colheita do café
Para ambos as formas, plena ou seletiva e tipos de colheita, a área pode ser verificada por talhão, para tomada de decisão de quais plantas serão colhidas e até mesmo qual é a porcentagem de frutos maduros ou verdes da lavoura, o que reflete em se está ou não no momento adequado para realização desta operação.
As amostragens podem ser feitas caminhando em “zigue zague” ao longo da área e amostrando 8 plantas, que devem ser selecionadas e colhidas para verificação do percentual de frutos verdes, cereja ou bóia.
A amostra – da qual será retirada a informação sobre percentual de cada um dos estágios dos frutos – é de 1 litro. Desta forma, o ideal é que o produtor tenha um recipiente dosador de 1 litro.
Do montante colhido (de todas as plantas amostradas e após a homogeneização da amostra, ou seja, mistura da colheita de todas as plantas), é que se retira uma amostra.
Desta amostra, os frutos devem ser separados em cereja, verde e bóia, e posteriormente quantificados.
Para fins práticos, se forem colhidos:
- 300 ml de frutos verdes = 30% de frutos verdes;
- 600 ml de frutos cereja = 60% de frutos cereja;
- 100 ml de frutos bóia = 10% de frutos bóia.
6 cuidados essenciais na colheita do café
De forma geral, podemos destacar 6 cuidados essenciais na colheita do café, são eles:
- Evitar o contato dos frutos com o solo ou com frutos já caídos no solo;
- Evitar o o armazenamento do café diretamente na lavoura por período superior a seis horas;
- Se a colheita for semi-mecanizada (com uso de derriçadoras) é preciso atenção na regulagem de trabalho;
- Se a colheita é seletiva (seja semi-mecanizada ou não), é necessário um bom treinamento prévio da equipe em campo;
- Após a colheita, é importante realizar a repassagem manual de retirada de frutos que restaram na planta, especialmente por ainda não estarem em fase de maturação;
- Os trabalhadores em campo precisam sempre usar EPIs (ou equipamentos de proteção individual).
A seguir, entenda cada um deles e a sua relação com o tipo de colheita realizada na lavoura.
Principais cuidados em cada método de colheita
Em cada um dos tipos de colheita que vimos anteriormente, é preciso ter cuidados específicos, vejamos agora cada um deles.
Colheita manual
Neste tipo de colheita, se utiliza o pano para colheita de café, peneira e sacaria para armazenamento dos frutos colhidos.
O primeiro passo é estender o pano de colheita embaixo dos cafeeiros, para que os frutos caiam sobre o pano, e não sobre o solo.
Isso porque, quando caem no solo durante a colheita, pode ocorrer a fermentação, afetando a qualidade dos frutos e, por consequência, da bebida.
Posteriormente, se realiza a derriça dos frutos de café sobre o pano. Ou seja, neste processo é feita a derrubada dos frutos sobre o pano. Assim, quando os frutos já estão no pano, as impurezas grandes como folhas e galhos, devem ser retirados.
O terceiro passo consiste em utilizar a peneira para realizar a abanação, processo que tem como objetivo a retirada das impurezas menores que ainda restam em meio aos frutos.
A retirada das impurezas é importante para evitar a deterioração precoce dos frutos.
Um cuidado indispensável e que influencia diretamente na qualidade, é o tempo decorrido da colheita e do beneficiamento (especialmente secagem) dos frutos de café.
Assim que colhidos, os frutos devem ser levados imediatamente ao local de beneficiamento e pós-colheita.
Durante a etapa de colheita e logo após a colheita, é preciso, principalmente:
- Evitar o contato dos frutos com o solo ou com frutos já caídos no solo – os frutos já caídos no solo normalmente já entraram em processo de fermentação, e isto interfere diretamente na qualidade dos frutos durante o armazenamento, devido aos microrganismos associados;
- Evitar o armazenamento do café diretamente na lavoura por período superior a seis horas, pois afeta a qualidade, principalmente por desencadear a fermentação em frutos muito maduros;
- Além disso, o uso de EPIs, ou equipamentos de proteção individual é item obrigatório na colheita do café (seja ela manual, semimecanizada ou mecanizada).
Colheita semi-mecanizada
Na colheita semi-mecanizada, é possível usar derriçadoras portáteis, ou seja, estruturas semelhantes às utilizadas na colheita de frutos em árvores de grande porte. Assim, a grande diferença entre a colheita manual e semi-mecanizada é o uso das derriçadoras. Os demais processos, utilizam os mesmos materiais, e os cuidados também valem para ambas as formas de colheita.
- Assim, estudos apontam ainda, que para o uso de derriçadoras, é preciso atenção na regulagem de trabalho, uma vez que a eficiência da colheita está relacionada ao contato das hastes com os frutos.
- Por fim, a única recomendação adicional é o treinamento prévio quando a colheita seletiva é realizada de forma semi-mecanizada, pois isso demanda de muita técnica.
Colheita mecanizada
Existem diferentes equipamentos que podem ser utilizados na colheita do café, incluindo colhedoras tracionadas e até mesmo tratores agrícolas ou automotrizes.
Em todos os sistemas é possível colher de forma seletiva ou plena, sem danos à planta. Além disso, na colheita mecanizada também é possível realizar a poda das plantas.
Alguns cuidados essenciais nesta colheita são:
- As mesmas precauções dos tipos de colheita vistos anteriormente se aplicam a este sistema, incluindo ainda a precaução sobre possíveis vazamentos de combustíveis ou lubrificantes, que podem ser prejudiciais ao ambiente e às plantas.
- Outro ponto importante, é que mesmo semimecanizada e mecanizada, nenhum dos sistemas dispensa a repassagem manual de retirada de frutos que restaram na planta, especialmente por ainda não estarem em fase de maturação, o que pode dificultar a retirada.
E após a colheita? Quais os próximos passos?
Independentemente do tipo de colheita, na pós-colheita, os frutos do café devem ser processados, o que exige boas práticas agronômicas para evitar a redução da qualidade dos frutos e, por consequência, da bebida.
Dentre as etapas, a secagem é considerada a etapa mais importante e determinante e pode ser:
- Natural – com frutos expostos ao sol em terreiros ou sistemas sem emprego de ar artificial;
- Ou em secadores artificiais – com uso de ar quente.
Assim, também é preciso ter alguns cuidados neste processo, pois a temperatura de secagem e outros fatores climáticos (especialmente na secagem natural e em terreiros) também podem influenciar na qualidade final do produto.
Por isso, é importante:
- Evitar presença de animais, quando o café for seco em terreiro;
- Controlar da temperatura na secagem: temperaturas altas provocam aumento dos níveis de lixiviação de íons potássio na acidez e graxa, parâmetros que alteram a qualidade do café. A temperatura não deve ultrapassar os 40ºC na secagem. Além disso, quando acima de 80ºC, os grãos adquirem cor acinzentada e se entrarem em contato com umidade do ar alta, adquirem coloração esbranquiçada;
- Ventilar bem o local de secagem. Além disso, se possível, este local deve ter uma base de piso asfáltico e cimento, pois estes materiais conferem uma secagem mais uniforme;
- Esparramar bem o café, evitando que se formem camadas sobrepostas;
- Monitorar o teor de água, ou grau de umidade, que deve ficar entre 11% e 13%; e o tempo em dias de todo processo de secagem, que compreende entre 10 e 20 dias, a depender do sistema, das condições climáticas e da presença de grãos verdes.
Conclusão
O café é uma bebida amplamente apreciada em diversas regiões do mundo.
No Brasil, é produzida principalmente no estado de Minas Gerais, o qual, proporciona condições climáticas, de solo, topografia e altitude ideais para a produção de diferentes tipos de café.
Dentre as espécies mais cultivadas e comercializadas estão o arábica e o conilon, que possuem diferenças significativas, especialmente no que diz respeito ao sabor.
Para uma qualidade final adequada da bebida, no entanto, as etapas desde o cultivo, até a colheita (especialmente ao ponto adequado em que deve ser realizada e em função do seu tipo), e a secagem, são fundamentais e devem ser controlas com rigor e precisão.
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Engenheira Agrônoma (UFFS), Mestra em Fitossanidade pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), com área de concentração fitopatologia. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) na área de sanidade vegetal e pós-colheita. Tem experiência nas áreas de fitopatologia, controle de doenças de plantas, grandes culturas, pós-colheita de grãos e sementes e agricultura de precisão.